domingo, 6 de julho de 2008

Mississipi em Chamas


Um filme sobre os negros, em que as personagens, com fala, com destaque, aquelas que sustentam a narrativa não são negras, os afrodescendentes simplesmente não aparecem. Não seria um tanto contraditório? Não, se a sociedade de que tratamos não fosse a Estadunidense.

Dirigido por um inglês, é verdade, mas produzido num país que deve muitas satisfações aos negros. Mississipi em Chamas é um filme bastante característico, segundo algumas análises Frankfurtianas, para assim dizer. Trata-se de uma narrativa dupla, pois pode ser lida como um texto bastante "didático" sobre um período da história dos Estados Unidos, ou pode ser analisada segundo o discurso implícito em seus personagens, sua construção narrativa, a ideologia "não explícita", e é pelo segundo caminho que seguirei.


As duas personagens principais personificam bem, na minha opinião, duas faces do cidadão americano(norte-americano). O primeiro deles (Willem Dafoe) o agente secreto do FBI, incorruptivel e disposto a comprar um Motel, sentar-se junto a um negro no restaurante sexista, é a imagem do serviço de inteligência estadunidense, e a qualquer custo, prezará pela manutenção de seu Estado forte. Já o outro lado da mesmo moeda é a personagem de Gene Hackmam, o cara que saiu do Mississipi, e entrou para o FBI, mas manteve seu jeito "texano"de resolver as coisas, ou seja, o jeito viril, sem muitas regras, mas com o mesmo objetivo de seu companheiro: manter a ordem, ou fazer justiça. O final do filme, nos revela bem a que veio essa personagem, seu "fazer do meu jeito" acaba por tonar a caçada à Ku Kux Klan, mais sangrenta, no entanto, é a única parte do filme em que os negros deixam de ser apenas vítimas das situações e têm alguma participação na queima do Mississipi.


A Igreja, está presente na vida desta comunidade, principalmente na dos negros, há a citação de uma das passagens da Bíblia pela personagem da cabeleireira, senhora Pell(Frances McDormand, que é casada com Joel Cohen, sim, de "Onde os fracos não tem vez") que denuncia o próprio marido, ao não resistir ao charme country de Gene Hackman. Ela fala que no Mississipi aprende-se a ter ódio dos negros, desde a educação religiosa, ela cita então o Genesis, como uma referência que corroboraria a vitoriosa segreção que o Estado do Mississipi viveria, segundo a personagem líder da Ku Klux Klan no filme.


Bom, vamos ao que interessa, o filme acaba com um final bem feliz, a prisão de todos os responsáveis pelo desaparecimento dos meninos (dois brancos que defendiam a não-segregação e um negro) que constituem a trama central do filme, o fim pelo a narrativa nos conduz pelos caminhos da xenofobica Mississipi. Portanto, faz-se justiça, anos depois, pois o filme é de 1988, os EUA reconhecem que erraram, através dos fatos contados sob a perspectiva de dois heróis brancos.


A América reconhece o erro, mas não dá voz a quem realmente interessa, os negros permanecem à margem, talvez não mais do sonho americano, mas do cinema, sua própria história ainda é contado através de alegorias basicamente brancas. Portanto, parodiando Jameson, o filme em quantão desempenha uma urgente função ideológica, ao mesmo tempo em provê o veículo para investir em um desesperado imaginário utópico. Com efeito, o filme é duplamente interessante , pois como nos diz Pierre Macherey, uma obra de arte não exatamente expressa ideologia, e sim, ao dotá-la de representação e figuração estética, acaba por sancionar o virtual desmascaramento e autcrítica da própria ideologia.

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